O
metabolismo humano proporciona sentidos múltiplos que geram reflexos conscientes
ou autônomos.
Fora dos
padrões tradicionais da ciência, podemos classificar estes sentidos como sendo
qualidades conceituais, para onde destinamos as atribuições intelectuais e
morais, tais como a inteligência, a intuição, a sensibilidade artística ou
emotiva, etc. Em seguida, as qualidades práticas, para onde canalizamos as
atribuições orgânicas, tais como a capacidade de sentir estímulos através do
tato, de digerir um alimento, etc.
Um
exemplo de qualidade conceitual é a capacidade de assimilação. Alguém expõe uma
teoria e uns entendem de imediato e outros não se atinam com o sentido. Outra é
a criatividade.
Um
exemplo de qualidade prática é a capacidade de regeneração. Se quebrarmos um
objeto ele não se reconstituirá por si mesmo, mas se acontecer um ferimento num
membro do corpo humano, o próprio organismo promoverá a recuperação. Outra é a
capacidade de adaptação. É justamente esta qualidade que nos interessa.
Sabemos
que no Nordeste faz calor e no Rio Grande do Sul faz frio. Se um nordestino,
por sua vontade, quiser morar no sul, com o tempo, certamente se adaptará ao
clima e costumes da região. Isto é a praticidade da adaptação. Todavia, nos
conceitos, ao alimentar-se com churrasco, lembrar-se-á das iguarias típicas do
nordeste. Escutará a música gauchesca e certamente preferirá as músicas
regionais de sua terra. Adaptou-se, mas não mudou os conceitos.
É
exatamente esta a questão. O ser humano muda apenas em aparência, mas os
costumes, as tradições, os conceitos permanecem os mesmos e somente com muitas
dores são mudados.
Através
da história, percebemos que o gênero humano errou muito mais por não se
atualizar em seus conceitos do que propriamente por falta de oportunidades e
circunstâncias de progresso.
Foi assim
que Moisés estabeleceu princípios civis oportunos diante das circunstâncias e
quando Jesus veio melhorá-los, séculos depois, sofreu todo o peso do
enraizamento restrito da letra por não compreenderem o sentido expansivo da
palavra.
Igualmente com Copérnico ao explicar que a Terra não é o centro do
universo ou Galileu ao afirmar que ela gira.
É como
diz o provérbio atribuído a Einstein: É mais fácil desintegrar um átomo do que
mudar um preconceito.
Em nome
das tradições, quantos crimes não foram cometidos?... Basta lembrar da
exterminação que Moisés determinou contra os povos nativos das terras de Canaã;
os cristãos nas arenas romanas; os turcos, os católicos e as cruzadas; os dias
negros da inquisição; a noite de São Bartolomeu e mais recentemente - provando
que apesar de todo o avanço científico, filosófico e tecnológico não houve
mudança de conceitos - os campos de extermínio na Alemanha.
"Um
navio francês entrava um navio inglês no porto de Santos". Qual o sentido
desta frase?...
Muitas vezes,
apegamo-nos a uma maneira equivocada de raciocinar e estabelecemos conceitos
rígidos, sem atinar que a lógica da verdade não segue um padrão comum. Determinamos
horizontes mentais restritos como se tivéssemos medo de mudar, de ver o que há
além, de usar toda a capacidade da máquina orgânica. Julgamos que nossos
conceitos, nossas verdades, formam nossa maior riqueza. Talvez seja. Mas qual a
importância desta riqueza quando provoca escravidão? Toda riqueza represada,
guardada, de nada serve. Temos medo do vazio que poderia ficar se anulássemos
todos os conceitos inúteis que infestam nosso consciente e inconsciente. Mudar
seria admitir o tempo perdido, que envelhecemos acumulando fatores que nada
significam. Por isso, quanto mais idade tem uma pessoa, mais difícil de mudar
os seus conceitos, por mais absurdos e errados que sejam.
Voltando
à frase, a palavra "entrava" refere-se ao verbo "entravar"
e não ao verbo "entrar". Ou seja, um navio francês bloqueava um navio
inglês, impedindo-o de entrar no porto.
Em outro
exemplo, antes da informática, nos estabelecimentos bancários, todos os chefes
eram pessoas com mais de trinta anos. Hoje a idade varia entre vinte aos vinte
e cinco anos. Por outro lado, naquela época tudo era feito manualmente. Hoje o
computador trabalha. Será que os antigos não tinham capacidade para lidar com o
computador?... Será que os jovens atuais são melhores do que os
antigos?... Pois afirmo com certeza que
os antigos além de mais capacitados ainda tinham a experiência. Entretanto, também
traziam os conceitos dos sistemas antigos, das formas ultrapassadas. As
mudanças vieram e eles tentaram adaptar-se quanto à prática, mas na mente
guardaram uma infinidade de regras e procedimentos obsoletos. Houve a
resistência. Os jovens vieram, com a mente aberta, acreditaram nas mudanças e
ocuparam os lugares dos clássicos senhores de conceitos rígidos.
Isto
acontece em todos os sentidos da vida. Em todos os lugares. É preciso aprender
a mudar. Questionar as razões e importância dos conceitos que herdamos dos
pais, dos professores, da sociedade, das religiões, dos instrutores, dos
líderes, etc.
Tudo que
restringe e impede o ser humano de crescer mentalmente, de aprender e evoluir,
de mudar, são conceitos desnecessários e devem ser esquecidos.
Quem teme
as mudanças mostra por si mesmo que não tem convicção daquilo que acredita como
certo. Por outro lado, quem conhece a verdade não precisa recear novos
ensinamentos, pois a verdade é um círculo em espiral perfeito e em nada pode se
contradizer; entretanto, sempre surgem novas camadas na sequência e se a lógica
e a razão diz que faz sentido, por que duvidar?
José Nunes Sobrinho
Campo Grande - MS
Diário do Interior - 10/01/1995
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